É papel da escola trabalhar o cuidar e o educar de forma integrada, pois desta visão decorre que, para favorecer o crescimento de um ser competente, autêntico e criativo, é nosso papel estabelecer uma relação de escuta afetiva com cada criança, buscando conhecer suas possibilidades, interesses e necessidades; suas percepções e indagações. Assim, caminhamos a seu lado, dando-lhe suporte e favorecendo que suas experiências e expressões possam ser vividas plenamente em um ambiente social e cultural que respeite seu direito de ser criança e lhe ofereça “alimento” para que seu desenvolvimento se dê de forma integrada.

Nesse sentido, as escolhas curriculares são de suma importância para que as experiências das crianças na escola sejam de fato significativas e para que a rotina escolar se dê de forma a garantir esta vivência integrada do cuidado e da aprendizagem.

É com esse intuito que buscamos trabalhar a rotina de forma a favoreçer as necessidades e interesses das crianças, garantindo a higiene, a alimentação, a brincadeira e o desenvolvimento dos demais projetos. A rotina dos grupos está em constante reavaliação, afinada com a dinâmica do individual e do coletivo, com o tempo (ritmo) de exploração de cada um e da criação coletiva.

O espaço da escola também é essencial para o desenvolvimento de nosso projeto e é considerado educador. Assim, deve ser ao mesmo tempo acolhedor e desafiador, instigando a criança a tocar, se aventurar, pesquisar e criar, e deve buscar gerar inúmeras experiências e aprendizagens. Entendemos que o espaço escolar declara seus valores. Desta forma, o espaço da Recreio favorece o desenvolvimento da autonomia, das relações interpessoais e das aprendizagens da criança, dando a ela possibilidade de realizar escolhas a partir de seus desejos e necessidades de experimentação, pesquisa e brincadeira.

A perspectiva até aqui apresentada baseia-se fundamentalmente numa relação de confiança, deslocando o professor do lugar daquele que ensina e guia a criança, para aquele que – carregado de seus saberes, suspendendo-os e duvidando destes quando necessário — estabelece com ela uma relação de respeito mútuo, de generosidade e parceria.

Este professor, em posição de escuta e sensibilidade, também se deixa contagiar e orientar pela criança, por suas perguntas, seus interesses e necessidades, e abre-se à possibilidade de redescobrir o mundo, encantado pela curiosidade, pelo olhar singular e pelo rico universo de fantasia e brincadeira tão característico da infância.

“Quando mantemos a especificidade da brincadeira, tem-se estes elementos que são a incerteza, a ausência de consequência e a decisão da iniciativa da criança e que definem este espaço aberto de experimentação, no qual o adulto não pode orientar muito, senão arrisca-se a destruir o interesse da brincadeira, ou seja, o fato da criança dominar o espaço de experiência.” Gilles Brougère.

Isto não diminui o trabalho ou a importância do professor, muito pelo contrário. Se na brincadeira se estabelece um espaço de liberdade e experimentação, o educador, por sua vez, assume uma postura de escuta, observação e testemunho sensível do gesto espontâneo e lúdico, para – munido destas observações e da constatação de interesses, saberes e necessidades das crianças brincantes – ser capaz de contribuir com este brincar, refletindo sobre e planejando sua prática.

Como afirma Renata Meirelles, “Não se trata de um espontaneismo ingênuo no qual vigora o afastamento do educador para dar espaço ao laissez faire, ao fazer por fazer, como se fosse suficiente conceder às crianças a oportunidade de brincarem livres, acreditando que num passe de mágica, todas as necessidades delas seriam supridas.(…)” Assim, além da observação e escuta sensível ao brincar espontâneo das crianças, organizar e planejar espaços, tempos e materiais para estas brincadeiras, bem como – em momentos que não os da brincadeira – pesquisar, selecionar e apresentar nosso repertório cultural de forma adequada e articulada às questões das crianças; são ações fundamentais da prática do educador. Ações estas que possibilitam ampliação e aprofundamento do repertório simbólico do grupo.

Desta forma, se estes conteúdos disponibilizados por nossa cultura (pela escola, por educadores e por outras crianças de suas relações) fizerem de fato sentido para elas, as crianças terão — por conta própria — oportunidade de integrá-los e ressignificá-los em seu brincar, ampliando e aprofundando seus saberes.